quinta-feira, 11 de setembro de 2025

A Realeza Social de Cristo: O Fundamento Divino para um Governo Justo e o Fim da Desordem Moderna

Em uma era marcada pela fragmentação, pelo relativismo moral e por crises institucionais que abalam a confiança dos povos em seus governantes, a busca por um princípio de ordem e justiça torna-se não apenas urgente, mas vital. A mentalidade moderna, herdeira do laicismo militante, habituou-se a relegar a fé à esfera estritamente privada, tratando a religião como uma opinião pessoal sem qualquer implicação na vida pública. Contudo, a Tradição da Igreja, com uma sabedoria de dois milênios, oferece uma resposta luminosa e perene a essa desordem: a doutrina da Realeza Social de Nosso Senhor Jesus Cristo. Longe de ser uma abstração piedosa, este é o fundamento teológico essencial para a construção de um governo verdadeiramente justo e para a restauração da paz duradoura na sociedade.

A Origem Divina de Toda Autoridade

O ponto de partida para compreender a Realeza Social de Cristo está em uma verdade fundamental da fé cristã, expressa de forma lapidar por São Paulo Apóstolo: "Non est enim potestas nisi a Deo" (Não há autoridade que não venha de Deus) (Romanos 13, 1). Este princípio estabelece que todo poder de governar, seja ele exercido em uma monarquia, uma república ou qualquer outra forma de regime, tem sua fonte última em Deus.

Isso não significa uma sanção divina para a tirania ou para o abuso de poder. Pelo contrário, significa que os governantes são ministros de Deus, investidos de uma autoridade delegada cujo propósito é específico e inegociável: a promoção do Bem Comum. Quando um governo legisla, julga ou executa, ele não o faz em nome próprio ou em nome de uma vontade popular abstrata e volúvel, mas como um participante da autoridade do próprio Deus, que é a fonte de toda a justiça.

O Papa Leão XIII, em sua encíclica Immortale Dei, ensina que o Estado, como sociedade organizada, tem o dever de prestar culto a Deus, pois dele depende. Ignorar esta dependência é o primeiro passo para a desordem, pois um governo que não reconhece uma autoridade superior a si mesmo torna-se, inevitavelmente, a medida de si mesmo, abrindo as portas para o totalitarismo e a violação da lei natural.

Quas Primas: A Proclamação Solene do Reinado de Cristo

Diante do avanço avassalador do secularismo no início do século XX, que culminou em guerras devastadoras e na ascensão de ideologias desumanas, o Papa Pio XI sentiu a necessidade de reafirmar esta doutrina de forma solene. Em 1925, com a encíclica Quas Primas, ele instituiu a Festa de Cristo Rei e apresentou ao mundo, de forma clara e inequívoca, os fundamentos do Seu reinado social.

Pio XI ensina que Cristo é Rei não por uma metáfora, mas por direito de natureza e de conquista. Por natureza, pois, como Verbo de Deus, Ele possui o primado sobre toda a criação. Por conquista, pois nos redimiu com Seu preciosíssimo Sangue. Este reinado não se limita aos corações dos fiéis ou aos muros das igrejas; ele se estende a toda a esfera da vida humana, incluindo a política e a social.

A encíclica detalha o tríplice poder que constitui Sua realeza:

  • Poder Legislativo: Cristo é a fonte de toda a lei. As leis humanas, para serem justas, devem estar em conformidade com a Sua lei divina e natural. Uma legislação que contradiz os mandamentos de Deus, como as que atentam contra a vida ou a família, é desprovida de verdadeira autoridade moral.

  • Poder Judiciário: A Ele foi dado todo o poder de julgar. Os governantes e magistrados exercem uma parcela deste poder e devem fazê-lo segundo a justiça e a verdade, lembrando-se de que prestarão contas ao Juiz Supremo.

  • Poder Executivo: Todos devem obedecer ao Seu império. A autoridade do Estado deriva d'Ele e, portanto, as nações e seus líderes têm o dever de reconhecer publicamente a Sua soberania.

A "peste do nosso tempo", como define Pio XI, é o laicismo, a nefasta teoria que busca construir a sociedade como se Deus não existisse. Esta recusa em submeter a ordem pública à doce lei de Cristo é, segundo o pontífice, a causa principal da instabilidade e dos conflitos que afligem o mundo.

Os Pilares de um Governo Justo sob o Reinado de Cristo

O reconhecimento da Realeza Social de Cristo não implica, necessariamente, um regime teocrático. A Igreja distingue claramente entre a esfera espiritual e a temporal. No entanto, exige que a esfera temporal (a política, a economia, a cultura) seja informada e iluminada pelos princípios do Evangelho. Um governo que opera sob esta luz se apoia em pilares sólidos.

O Bem Comum como Finalidade Suprema

O objetivo de um governo justo não é o poder pelo poder, nem o enriquecimento de uma elite, nem mesmo a simples satisfação da vontade da maioria. Sua finalidade é o Bem Comum: o conjunto de todas as condições sociais que permitem aos indivíduos, às famílias e às associações alcançar mais plena e facilmente a própria perfeição. Isso inclui a paz, a segurança, a justiça, a moralidade pública e as condições materiais necessárias para uma vida digna, sempre com vistas ao destino eterno do homem.

A Justiça e a Caridade como Virtudes Reitoras

Um Estado que reconhece Cristo como Rei deve pautar suas ações pela justiça, dando a cada um o que lhe é devido, protegendo os direitos dos mais fracos e punindo o mal. Mas a justiça, por si só, não basta. Ela deve ser aperfeiçoada pela caridade, a virtude suprema que busca o bem do outro e promove a concórdia e a solidariedade social, criando uma "civilização do amor".

O Respeito à Lei Natural e à Subsidiariedade

Um governo cristão reconhece a existência de uma lei natural, inscrita por Deus no coração de cada homem, que é anterior e superior às leis do Estado. Esta lei protege direitos inalienáveis, como o direito à vida, à propriedade e à liberdade religiosa. Além disso, governa segundo o princípio da subsidiariedade, segundo o qual as instâncias superiores não devem assumir as funções que podem ser realizadas pelas instâncias inferiores (como a família ou as comunidades locais), mas devem, ao contrário, ajudá-las e apoiá-las em sua autonomia.

Conclusão: A Única Esperança para a Paz

A doutrina da Realeza Social de Cristo não é uma utopia política, mas a apresentação da única ordem realista e possível para a paz duradoura. Ao negar a soberania de Cristo sobre a sociedade, o mundo moderno entregou-se a ídolos: o Estado, a raça, a classe, o mercado ou o indivíduo autônomo. O resultado é a desordem que testemunhamos: a tirania do relativismo, a cultura da morte, a corrupção endêmica e a perda do sentido da existência.

Restaurar todas as coisas em Cristo, começando pelo reconhecimento público de Seus direitos sobre a sociedade, é o caminho para a verdadeira liberdade, para a justiça autêntica e para a paz que o mundo não pode dar. Aos governantes, cabe a responsabilidade de legislar em harmonia com a Sua lei. Aos cidadãos, cabe o dever de trabalhar, rezar e lutar para que a bandeira de Cristo Rei volte a tremular sobre as nações. Pois, como proclama o Salmo, "Feliz a nação que tem o Senhor por seu Deus!" (Sl 33, 12).

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Tomista, dedico-me ao estudo da Filosofia, que pela luz natural da razão nos eleva ao conhecimento das primeiras causas, e da Teologia, a ciência sagrada que, iluminada pela Revelação, a aperfeiçoa e a ordena ao seu verdadeiro fim. Ambas as ciências são para mim os instrumentos para buscar a Verdade subsistente, que é Deus, o fim último para o qual o homem foi criado.

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